quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O Privilégio do Disparate – A caminho do fim do Mundo – Semana 08 – (Dá-me licença por favor? Gosto sempre de lavar as mãos depois de fazer chichi…)

Querendo dar continuidade ao tema da semana passada; fui ao cinema ver o “Discurso do Rei” que é sem qualquer dúvida uma grande lição de amor. Começa por ser uma lição de amor para quem gosta de cinema mas sobretudo para quem gosta de história e de uma boa história e podia estar aqui o dia todo e ainda entrar pela noite dentro a adjectivar o filme mas não é esse o objectivo desta lengalenga, se não tiverem nada melhor para fazer vão ver o filme e se tiverem alguma coisa melhor para fazer guardem para fazer noutro dia qualquer e vão ver o filme.

Sem querer contar de mais, este filme faz a coisa muito difícil que é contar de forma muito fácil a história de alguém que não nasceu para ser rei e de repente se vê obrigado a ser e fala de outros homens que se fizeram grandes e de homens que se tornaram pequenos e de amizades e de amores e de irresponsabilidades que alguns disfarçam de romantismo e de traumas e de tantas pequeninas coisas que merece ser visto e revisto e dissecado pelo puro prazer e deleite com que nos deixa quando o acabamos de ver.

Por coincidência neste dia em que fui ver uma historia bem contada de homens que souberam ultrapassar-se a si mesmo e encontrar o seu lugar da história como incentivadores de outros homens, líderes a seguir e exemplos para os seus, também soube mais histórias de mais homens que muito provavelmente também irão encontrar o seu lugar na história como desmotivadores de homens, lideres a perseguir e exemplos pelos seus, mas de quem nunca se farão filmes nem contarão histórias que nos deleitam e dão prazer.

Primeiro foi um Sr. Especialista demissionário que se recusa a ocultar a face e que não renega a boa tradição Portuguesa do desenrasque e que quando apertado pela necessidade de um atestado em vésperas de uma ida ao estrangeiro não hesita em passar ao lado de quem for preciso e entrar pelo gabinete a dentro da médica de serviço e exigir o tratamento privilegiado que alguém que tanto já se sacrificou pelo País tem direito. É de homem. É deste tipo de raça que o nosso povo precisa; alguém que sabe sobrepor-se à maralha e não tem medo de ser mais notícia; alguém que conhece a sua importância; alguém que sabe como resolver problemas sem olhar a sequências nem consequências.

Depois foi o primeiro deste nosso governo a nos revelar a sua astúcia e argúcia e mestria na arte da gestão de crises que não vacila em classificar de mal educado um pobre rico e por mero acaso bem sucedido empresário dos tempos das vacas gordas e destes tempos de galinhas magras quando este ousa afirmar que não vale a pena esconder o Sol com a peneira porque estamos mesmo em recessão. É de homem. É deste tipo de lideres que o nosso povo precisa; alguém capaz de nos mostrar que de nada vale o sucesso do privado se este não tem etiqueta; alguém que nos evidencia a pouca importância do conteúdo face à crueza da forma; alguém que combate as vozes dos velhos do Restelo que querem prevenir o povo de ir em frente só porque este está à beira do abismo.

Fui ver o “Discurso do Rei” que é um belíssimo filme que nos conta uma história de homens no mesmo dia em que também ouvi falar de outras histórias de homenzinhos.

Deolinda – Que Parva Que Sou

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O Privilégio do Disparate – A caminho do fim do Mundo – Semana 07 – (Não sei bem a que horas passa o autocarro, se calhar o melhor é ir de metro)


Se o amor fosse fogo que arde sem se ver seria um perigo público e proibido por muitas bulas e leis e quem ousasse amar teria à perna os bombeiros a protecção civil, a ASAE, a GNR, a PSP e meia dúzia de empresas fiscalizadoras geridas por amigos do governo.

Sou um agnóstico militante e um céptico moderado e um desconfiado por amamentação e no que toca ao amor um pouco de tudo e de nada. Já tanto se falou e escreveu e encenou e cantou sobre o amor que se torna difícil escrever qualquer novo disparate sobre o tema. Há quem diga que é causa, há quem diga que é razão e há até quem diga que é fodido e eu acho bem que seja senão não teria graça nenhuma.

Muitos são os que professam que não se consegue viver sem amor e muitos são os que professam que o verdadeiro amor é o deles, seja a um homem, a uma mulher, à imagem que vêm no espelho, ao sangue do seu sangue ou ao sangue de um Deus, à raça de um clube, à ideologia de uma politica ou a qualquer outra coisa maior ou menor. Muitos dizem-se completos na presença do seu amor e lamentam a desgraça de quem não consegue amar como eles. Muitos são os que professam que o amor não é mais que uma boa ferramenta de marketing, um produto com venda garantida, um devaneio de poeta, uma arma de controlo de massas, um sentimento inodoro, incolor, indistinto ou uma quimera que se procura de olhos abertos. Muitos dizem-se completos na abstinência do amor e lamentam a desgraça de quem não consegue deixar de o procurar como eles. Sendo um agnóstico, céptico e desconfiado não vou pelas profecias de muitos e não reconheço legitimidade a quem ousa dizer que sou infeliz por não amar o mesmo e não reconheço legitimidade a quem ousa dizer que sou infeliz por não engavetar o amor naquela gaveta, se bem que nenhuma nem ambas das ilegitimidades me tem feito mais feliz ou infeliz. Na realidade o amor não me incomoda e eu deixo-o andar por aí.

Se muito se fala de amor a medo se fala de paixão, esta um contraponto efémero do outro que se supõe eterno enquanto vai durando. A paixão está para o amor como o aquecimento de um carro está para uma lareira. Na paixão há sexo e fome e sede e vontade, no amor às vezes também. A paixão pode ser um impulso e o amor pode ser um refluxo. A paixão pode ser uma refeição ligeira ou de muitos pratos num restaurante qualquer e o amor vai-se comendo… quase sempre na mesma mesa. Há quem prefira uma boa paixão a um grande amor, eu sou agnóstico, céptico e desconfiado e vou vivendo um dia de cada vez, todos os dias.

Mler Ife Dada - L'Amour Va Bien, Merci

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O Privilégio do Disparate – A caminho do fim do Mundo – Semana 06 – (Quem tratará das cáries da Boca do Inferno?)

Eu lembro-me que quando era pequenino e traquinas fartava-me de perguntar porquê e depois fiquei grande e traquinas e não me farto de perguntar porquê. Nesta minha incerteza de crescer e saber vou inquirindo e descobrindo que este Mundo pode ser redondo e revolver-se sobre si mesmo e rodar à volta das estrelas mas há coisas que nunca mudam ou que mudam tão devagarinho que só damos pela mudança quando ela deixa de ser evidente para ser permanente.

Aqui há dias percebi de maneira dolorosa que me tinha esquecido de mais uma data. Porque é que as mulheres não conseguem perceber de uma vez por todas que os homens não são geneticamente capazes de se lembrarem de uma data? Sempre que um homem diz a uma mulher com ar convencido e sorriso farsolas : “Querida estás a ver, não me esqueci que dia é hoje!”, está a mentir! Das duas três ou alguém o lembrou ou algo o lembrou ou alguma coisa o lembrou.

Eu sou tão distraído que me esqueço de arranjar alguém ou algo ou alguma coisa que me lembre do que não me devia esquecer e depois acabo por ter que enfrentar aquele olhar, aquela ironia, aquela forma tão particular e eficaz que as mulheres têm de fazer os homens gaguejar e não saber o que fazer às mãos. Se é genético que os homens não se lembram as mulheres não se esquecem e aprenderam desde sempre a tirar partido disso.

Eu sei que é suposto os homens serem diferentes das mulheres e eu aprecio isso de várias curvilíneas maneiras mas há realmente coisas que podiam ter sido evitados ou como se dizia no meu tempo de juventude: “Não havia necessidade…”, não havia necessidade de as mulheres terem certas capacidades que nos deixam a nós homens diminuídos pelos nossos defeitos naturais, não é justo, isto não é igualdade de géneros, é descriminação evolutiva ou divina conforme a crença e não me venham acusar de ter complexo de Calimero que eu não aceito, é uma injustiça é o que é!

Depois por coincidência ou talvez não, as mulheres inventam datas para tudo o lhes passa pela cabeça que tem que ser importante, para ela, para ele e sobretudo para eles: “Hoje faz um ano, dois meses e três dias que comemos uma fatia de bolo e bebemos uma água sem gás naquele café de esquina ao pé do banco e passou uma menina com um balão vermelho e meias às riscas laranja e verde e sorriu para nós, lembras-te querido?” Claro que não se lembra, mas se for esperto diz que sim e acrescenta: “Não eram riscas laranja eram Cor-de-Rosa!”, o que fará com que o debate se desvie para uma discussão sobre a incapacidade dele distinguir uma cor da outra, lugar de dialogo muito mais pacifico do que aquele para onde ela o queria levar quando começou a conversa.

Com certeza que aceito que há esquecimentos indesculpáveis e esses normalmente pagam-se caro, porque felizmente todas as mulheres têm o seu preço e não estou a querer ser ordinário, antes pelo contrário, quero apenas dizer que as mulheres são enormemente capazes de perdoar desde que o homem consiga perceber ou adivinhar, a forma certa de lhes pedir desculpa. Aliás se os homens fossem seres avisados, quando começam uma relação, a primeira coisa, mas mesmo a primeira coisa que deviam tentar perceber sobre ela é o que é que a consegue demover, derreter, deslocar, desmanchar, desarticular ou desencaixar das suas intenções de lhes torcer o pescoço ou deixar a pão e água a vegetar no sofá até ao final do Verão.

O que ainda não percebi é se as mulheres não preferem às vezes que os homens se esqueçam das coisas para lhes poderem mostrar que são uns vermes insensíveis que não lhes dão importância nenhuma e que não se preocupam com nada do que lhes é importante e que se calhar o melhor era que aquilo nunca tivesse acontecido porque assim ela também já não precisava de se lembrar. Entretanto com esta conversa lembrei-me que hoje me devo de ter esquecido de alguma coisa, estou lixado!


Deolinda - Um Contra O Outro

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O Privilégio do Disparate – A caminho do fim do Mundo – Semana 05 – (Tenho que começar a ter mais atenção aos prazos de validade dos iogurtes)


“Não fui eu… Nem sequer lhe mexi…” E mesmo que tenha sido ou lhe tenha mexido, ninguém viu por isso não me tentem acusar seja do que for que eu sou inocente até alguém conseguir provar o contrário.

Aqui há uns dias houve eleições e já tinha falado nisso e como previa nada se alterou e não queria voltar a falar nisso e se estou a falar nisso é porque muitos tentaram votar e não conseguiram e se não conseguiram paciência fica para a próxima que o que não faltarão são novas oportunidades de votar que é um dever cívico e uma nova oportunidade de mudar e mudar não é fácil mas necessário e importante e já se escreveram muitos livros sobre mudança e da sua necessária importância e um dia destes ainda escrevo também sobre isso mas hoje mesmo não querendo falar nisso vou falar noutra coisa.

A razão porque muitos tentaram votar e não conseguiram pode ser explicada pela necessidade que a sociedade moderna tem de evoluir para uma sociedade mais simples e justa onde os cidadãos há muito deixaram de ser apenas um número para passarem a ser muitos números que andavam dispersos por muitos cartões até que alguém se lembrou de que se calhar era giro concentrá-los todos num cartão único ou para que não viessem os humoristas fazer piadas fáceis, um cartão do cidadão com montes de electrónica e biotrónica e coisas modernas para se tratar na internet.

Poderia parecer normal ao homem simples que ao simplificar, todos os números que nos identificam passariam a ser um só, único e inequívoco, atribuído à nascença, agora e na hora da nossa morte, mas alguém muito mais evoluído que um homem simples, diria mesmo um homem complicado, achou que isso seria diminuir o cidadão na sua importância de cidadão e de contribuinte e de beneficiário e de utente e de eleitor e o cartão único ou do cidadão, por causa das graças, podia ser único mas teria que ter muitos números mas ainda assim pelos vistos não os suficientes.

A razão porque muitos tentaram votar e não conseguiram foi porque algo imprevisível aconteceu e digo imprevisível porque tudo o que corre mal neste País é mero fruto do acaso, esse malandro danado para a brincadeira que tanto riso gratuito nos tem proporcionado. Parece que era suposto informar o cidadão de algo que ele não tinha ainda sido informado mas como por acaso não foi informado, o cidadão tinha a obrigação de se informar antes para não ficar indisponibilizado de obter a informação por existirem muitos a se tentarem informar depois. Pode parecer complicado mas na verdade é simples como o que se pretende de todo o sistema.

Na realidade quem tem o direito e o dever de votar já tem o dever e o direito de saber como é que funciona este País, funciona e pronto e quando não funciona não devia surpreender ninguém porque como dizem os Americanos: “Shit Happens dude”. Não vale a pena virem os chatos do costume tentar arranjar culpados, neste nosso País não há incompetência, nunca houve, nunca haverá e até se poderia simplificar o dicionário abolindo simplesmente a palavra e se ainda não se fez não será nunca por incompetência, até porque a palavra nem existiria.

Eu que sou tão simples como o tal cartão único que só não é único por causa das graças, sinto-me orgulhoso de viver num País onde não há incompetentes, sinto-me seguro por saber que tudo funciona por defeito e senão funciona é porque já nasceu com defeito, fruto do acaso ou mesmo da sorte ou da falta dela e que mesmo quando há merda isso não significa que alguém a tenha cagado.

É bom concluir que não sou apenas um número e que continuo a ser muitos, alguns ainda um competente mistério por se revelar.


Sérgio Godinho - O Coro das Velhas