Acordei cedo…. Cedo para quem se deitou tão tarde e dormira apenas quatro horas intercaladas por aquela sensação de intermitência entre estados de consciência e sonho. Levantei-me de arrasto para a casa de banho e olhei o rosto reflectido no espelho, as manchas escuras debaixo dos olhos escavavam-se na pele e enchi a banheira, despi-me e entrei na água. Fechei os olhos e comecei a sentir frio, abri a torneira de água quente e o calor aumentou aos poucos até me incomodar, voltei a fechar a torneira.
O corpo submerso, as pernas arqueadas, fora da água, a superfície criava ondas minúsculas a cada respiração, imaginei que a água se tinha transformado em gelatina solidificada à volta do meu corpo, não ousava mexer-me para não romper a coesão perfeita entre o liquido e aquela massa de carne. Somos massas de carne que rompemos coesões de fluidos ou gases quando nos movemos e movemo-nos porque somos dotados de vontade e a vontade é o que nos separa do irracional e a racionalidade faz-me equacionar porque razão estou aqui mal dormido e só nesta banheira de água que me cobre toda a pele, do pescoço até às ancas.
De repente… O que eu gosto dos meus repentes, são aqueles momentos em que tudo fica claro, todas as boas decisões que tomei na vida foram sequencias e consequências de repentes, são aqueles momentos em que não tenho mais do que certezas e foi naquele repente em que ficou claro e que tive a certeza de que estava a ficar louco.
Fiquei feliz com a descoberta, senti-me aliviado, ainda não estava louco, apenas a caminho e isso permitia-me avaliar os meus pensamentos, mesmo os mais estranhos e bizarros, como normais para um louco em potencial, a partir deste instante o mundo mudou de cor, já não era um patinho feio mas um cisne mesmo feio e tudo o resto havia de caber debaixo desta etiqueta. O que fazer com esta descoberta fantástica? Tinha que registar este processo evolutivo, deixar testemunho, fazer um diário que não começasse por querido diário mas por hoje comecei o meu caminho para uma doce e saudável loucura.
Saí para a rua e assim que pisei o passeio uma pessoa, não quero perder significado por a identificar como homem ou mulher ou gorda ou magra ou baixa ou alta, uma pessoa comum que lhe faltava uma referencia e que me perguntou as horas ao que eu respondi que não usava relógio e que o tempo era uma coisa relativa e à qual dávamos demasiada importância, considerava o facto de os relógios serem redondos como uma fraude porque se o tempo existe ele estende-se em comprimento e nunca em retorno ao ponto de onde partiu e lembro-me também de ter falado noutras coisas que agora já não me lembro e que a pessoa me virou costas e abanou a cabeça e foi perguntar o mesmo a outra pessoa que estendeu o pulso e a enganou porque passamos a vida a enganarmo-nos uns aos outros mesmo que não nos demos conta disso.
No meu primeiro dia como louco ou sem excesso de pretensão como aprendiz de louco ou louco em estado embrionário, pouco mais foi digno de registo neste meu diário, salvo talvez que jantei um daqueles meus esparguetes aldrabados com ovos mexidos com tudo o que encontrei no frigorifico e muita pimenta e uma punheta de mostarda, mas não sei ainda se isto é um acontecimento digno de aqui ficar ou se apago depois e como de costume manchei a camisa a chupar a massa e não sei se as nódoas de mostarda saem com uma lavagem normal ou se é melhor ir à lavandaria amanhã, joguei-a para um canto e decidi que pensaria nisso depois.
Nota: Apenas irei publicar aqui algumas entradas deste diário, o resto digam-me o que fazer com elas.
Jason Mraz-lucky i'm in love with my best friend