quarta-feira, 10 de junho de 2009

Irrespirável


http://littleboyj.blogspot.com/2009/05/criatura-da-noite.html
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A bruma de um acordar sem cheiros começava agora a dissipar-se, percorri o caminho que me separava do parque no lapso que demorou o incandescente do cigarro a chegar ao filtro, senti o calor nos dedos e joguei a beata na direcção da sarjeta, como sempre ficou sem cair sobre as grades e com o pé fi-la mergulhar no esgoto, alimento para os peixinhos, pensei … O dia estava a ficar quente e eu gosto do calor, mas também gosto do vento e da chuva, nunca foi por causa do tempo que se me amornam os espíritos, costumo dizer que comigo o estado do tempo não é assunto de conversa, nem desculpa para me abrigar, embora não desdenhe enroscar-me noutros corpos em dias de poucas razões para apanhar ar.

Caminhei pelos caminhos de areia batida, ladeados do esverdeado de relva semi-amanhada, aqui e acolá árvores de plantação recente entre outras com memórias mais antigas remanescentes do bosque que já ali existia antes da cidade transbordar das margens do rio para o interior da terra. Algumas árvores mostravam rasgos gravados na casca expressando a necessidade dos homens de provarem uns aos outros, amores e ódios em formas de figuras de corações estilizados e nomes ilegíveis ou simplesmente marcas sem outro significado maior do que amostras de estupidez. Um dia passei-me com um rapazola que se entretinha a gravar num abeto com idade para ser seu avô, com um canivete, umas cruzes malditas, perguntei-lhe se não preferia que lhe tatuasse na testa o verdadeiro nome do fuher, armou-se em valente e acabou com um dente na mão, não que eu seja bom de porrada mas certas coisas transcendem-me do físico.

Avistei-o ao longe, sentado num banco a fingir que dava de comer aos patos, franzino, com ar de fuinha, o exemplo acabado do que devia ser um bom filho da puta sem vergonha da mãe, sorriu com ausência de pudor e poucos dentes, o cabrão devia ser proibido de abrir a boca em público, com tanto podre negro e o resto amarelado, dava nojo só de olhar - Ouviste a minha mensagem? – Perguntou com aquela voz de gozo com que se achava importante - Claro, porque razão achas que aqui estou, pelo prazer da tua companhia? Olha lá e um banho de vez em quando? – Aquilo até podia ser entendido como um insulto, não fora o cheiro nauseabundo que dele emanava e eu que ainda há pouco me faltava um cheiro, voltou a sorrir - A agua gasta a pele e já tomei banho um dia destes, até pus champu e tudo… mas se não me queres enrabar, não precisas de me cheirar, estás interessado no negócio? - Sentei-me no banco, tão afastado quanto possível - Talvez, mas parece-me uma coisa perigosa, eu sempre me dei mal quando me meti com políticos, de que lado está o dinheiro? – Levantou-se, agora mais sério - Perigoso? Talvez… mas agora deste em maricas foi?! O dinheiro diz-me tu, que tens mais experiência, virá do partido? Se calhar aquele teu amigo da televisão era capaz de pagar uma massas pela história ou a mulher, que dizem está forrada e lhe paga a carreira.

Levantei-me e olhei na direcção do lago para a superfície da água, plana de brilhos, serena e limitada sem nascente nem poente e recordei aquela pele suave e o momento em que a penetrei, o seu comprimir de coxas, os seus suspiros, por que raio me estava a lembrar disso agora, neste momento em que sentia a acalmia do ar e a serenidade das águas, nada, mas mesmo nada do que se tinha passado na noite se podia relacionar com calma, fora fogo, combustão de exaustão, o instante do fósforo - ele continuava a falar - quem era aquela mulher? Porque tinha entrado na minha vida? Porque desaparecera? Teria sido num sonho, a minha cabeça em roda livre, dando corpo ao desejo, não seria a primeira vez, mas eu sabia que não, a marca nos lábios ainda ardia, mas eu podia ter-me mordido no sonho, mas o bilhete e a embalagem do preservativo eram reais, não eu não tinha sonhado, o mar trouxe-me uma sereia, o vento pousou-a na falésia e uma mulher bem real consumiu-me, deixou-me irrespirável - ele continuava a falar - eu a tentar sentir ainda nas mãos o curvo dos seus seios, o rijo dos seus bicos e o calor húmido do seu interior - ele puxou-me o ombro - num repente a visão foi-se, morta!

- Olha lá, estou aqui a falar para o boneco? Estás interessado no negócio ou não? Porque se não estás, eu tenho mais quem esteja, não penses que és o único esgravulha vidas que conheço.
- Que garantias tens que é verdade o que me contaste? – Perguntei, enquanto acendia mais um cigarro.
- Dá-me um… Olha eu disse-te que tinha tomado banho um dia destes, engatei um gajo num bar, todo pintas, queria que eu lhe fizesse uma mamada, mas obrigou-me a tomar banho primeiro, ora o gajo pelos vistos tinha um namorado que lhe pôs os cornos e ainda estava fodido com a história ou neste caso deixou de ser fodido por causa da história e contou tudo, como os tinha seguido e apanhado num quarto de hotel na beira da auto-estrada – Dei-lhe um cigarro, que acendeu com as mãos a tremer.
- E tens o nome do tipo?
- Sim, o gajo gostou de se vir na minha boca, quer voltar a ver-me, deu-me o número de telefone e tudo – Só de imaginar alguém a querer ser chupado por aquela boca, dava-me náuseas, não sou preconceituoso, mas há coisas que não consigo mesmo perceber.
- E tu vais-me dar o número e o que queres em troca?
- Ora a tua eterna amizade e metade do que conseguires sacar e continuo a dizer que quando tiveres as coisas certinhas e bem cozidas, a mulher deverá ser quem dá mais dinheiro para as enterrar, tu sabes quem é a gaja, boa como o milho não que eu goste muito de milho, aparece muitas vezes a fotografia nas revistas, a das festas.
- Sei… Olha ainda não tenho a certeza de que me quero meter nisto, tenho trampa na vida que chegue, realmente estou um bocado à rasca de dinheiro e não tenho nada em vista, fazemos assim, tu dás-me o número e eu vou pensar no assunto, como sei que o vais tentar vender a mais dois ou três não perdes nada se eu decidir ficar quieto, se conseguir alguma coisa dou-te um terço e sabes que pelo menos não te engano, um terço comigo é um terço… - Olhou para mim e riu-se, escusava de o ter feito, meteu a mão no bolso, tirou uns pedaços de papel e deu-me um deles, com um piparote na beata jogou-a para um canteiro e virou-me as costas, após ter andado alguns passos disse – Depois dá noticias, eu telefono para saber novidades.

Fiquei ali ainda um bocado a tentar apenas respirar, sem saber o que fazer, tirei a carteira para guardar o pedaço de papel e reparei na embalagem de preservativo e pela primeira vez olhei para ela e para o que dizia:

“Bar Sweetcool Nights, cortesia da casa para um final feliz”

The Corrs-Breathless

10 comentários:

Maria disse...

"Bar Sweetcool Nights, cortesia da casa para um final feliz"

ehehhehhe

Conta lá que final feliz é esse. :))

As voltas que já deu esta história :P aguardo o próximo episódio...

beijinho

Fada disse...

Prendo-me a esta história sem respirar... :)

E também estou com "ele", dá-me náuseas a ideia de alguém tocar naquela boca do outro gajo... blearrghhhh


Mais, mais, mais!!!!


Beijitos :)

Pearl disse...

Tão bom que me senti roubada no final deste texto. Continua por favor!! queo ler/ver o desfecho.Mantenho o meu olhar sobre a história de amor que nasceu, atenta e a torcer que corra tudo muito bem!


beijos

LBJ disse...

WAI,

Final feliz, ideias de amalucado :)

O próximo episódio vai passar-te pelas mãos logo logo, obrigado ;)

Um Beijo

LBJ disse...

Fada,

O Próximo episódio vais surpreender-te e terás que o procurar tu sabes onde :)

Beijo

LBJ disse...

Pearl,

Esta história continua enquanto eu perceber que interessa a alguém, esteve para terminar aqui pela falta de comentários.

Ainda não sei se será uma história de amor, veremos :)

Beijos

Pronúncia disse...

E quero ler o 4ºcapítulo!

Deixa para o escreveres já tens... "Bar Sweetcool Nights..."

Beijo

LBJ disse...

Pronúncia,

Sim tenho a deixa, a pista estava lá desde o início ;)

Mas... o 4º não vai por ai, terás uma surpresa e será publicado no prisão dia 20 :)

Beijo

CB disse...

Que a falta de comentários não te faça deixar isto por acabar! Eu quero saber o final. :)

LBJ disse...

Princesa,

Bom o final... Não sei... mas ainda vais saber mais algumas coisas, vai passndo por aqui ;)