No fundo do meu quintal, tenho uma pedra angular não filosofal, atrás da qual se esconde uma escada que desce e desce e desce e quem a desce não fica com vontade de a voltar a subir, por isso é uma escada só de descer, ao contrário de muitas que só sobem e as inconstantes que sobem e descem como a vontade de ignorar a vida. Quando se desce essa escada chega-se a uma estação de comboios, daquelas que recordamos do tempo em que éramos crianças e os comboios eram meios de partida para qualquer lugar antecipado num sonho. Só há um destino que se pode alcançar a partir dali, um reino antigo onde não existe indiferença, nem preconceito, onde os animais não se escondem nem se comem, onde a nutrição é um processo de assimilação de ar e a moeda oficial é o sorriso e o sexo é pratica obrigatória decretado por bula real e abençoado por cardeais sem vinculo de credo.
-Pára! - Dirão os meus leitores, habituados a que os conduza nestes privilégios em direcções de graçolas camufladas em disparate, se queres ser sério, escreve uma canção de amor ou reescreve uma receita de bacalhau, não te ponhas em melancolias a contar de reinos mágicos que não nos refrescam os olhos, nem nos adiantam ou atrasam o orçamento mensal, mas eu queria hoje relembrar aquele reino onde os animais não se escondem e falam uns com os outros numa língua comum que não se consegue reproduzir com tinta nem byte. Eu ainda tenho amigos naquele reino, sem saber bem como, fiquei unha com carne de amizade com um pinguim pançudo, ave de espécie sem temor das alturas, nem problemas em arrastar o cu pelo chão que mesmo sabendo que não era particularmente atraente fez a corte à fêmea mais exuberante do baile, espécime desejado por todos, altiva de perna alta e pescoço esguio, grandes asas e um rabo de perder o tino.
Casaram. Mesmo assumindo que eram um casal improvável, ele pinguim pançudo de riso fácil e logo por isso rico, uma vez que não nos podemos esquecer que o sorriso é naquele reino a moeda oficial, ela avestruz de rabo de perder o tino, séria como uma noite de lua nova, logo sem grande poder de compra, mas bem capaz de trocar o amasso das penas por bem estar o que por ali nem sequer era mal visto. Ora então vamos lá abordar a faceta do disparate e puxar pela imaginação e visualizar a cópula na noite de núpcias entre um pinguim voluntarioso e uma avestruz fogosa, pois foi não correu muito bem, mas ele não desistiu e insistiu e ela lá foi simulando gemidos de prazer e lhe dizendo como a preenchia e ele ave jovial mas consciente da sua dimensão lá percebeu que a felicidade não se constrói acreditando em orgasmos simulados e um dia a olhar-se ao espelho tomou consciência da dimensão do seu bico e do poder que aquela língua afiada lhe dava e escusado será dizer que hoje são muito felizes e ela a fêmea mais rica do reino a desperdiçar sorrisos e não me peçam para vos descrever que filhotes saem dos ovos num cruzamento entre pinguins e avestruzes façam-no por vós, como exercício libertador do racional e do preconceito e por um momento acreditem que por aqui o sorriso também pode comprar felicidade.
Go Go's-Our lips are sealed
14 comentários:
Obrigado, LBJ, por mais um privilégio! :) Fantástico!
Tu escreve mais é um livro!
PS: Cá para mim anda aí gata... (ou isso ou um disparate de alguém que pensa que adivinha e que afinal não passa de um mau entendedor...).
Estarei atento :)
Giríssimo, LBJ, obrigado por estes sorrisos (valiosa moeda...) logo pela manhã :)
O pior é que estou mesmo a imaginar um pinguim pançudo em agitada cópula com uma avestruz toda vivaça!
E tal imagem vai acompanhar-me durante o dia todo!
Obrigadinha, sim?
;)
Além de teres uma imaginação para lá de fértil, escreves bem "comó caraças"...até chateia. Irra!!!!!
;D
"... And I'm divided between penguins and cats, but its not about what animal you've got, its about being able to fly its about dying nine times..."
Recordou-me isto, porque sim.
http://www.youtube.com/watch?v=LcRytwTjLtg
beijinho
Descer a escada em direcção aos sonhos é bom quando não se fica a estação, mas se parte em busca do que queremos, sabendo de antemão que ao reino das maravilhas se chega com arranhões e cicatrizes. Mas lá pode-se encontrar o improvável, como improvável é a união de um pinguim com uma avestruz.
Tenho para mim que não interessa a dimensão do bico ou o tamanho do pescoço. O que interessa é se os dois cantam na mesma direcção.
É daí que nascem filhos perfeitos.
Realmente a arte tem destas coisas, o leitor que sou tem dificuldade em entender tantas coisas que escreves e se escreves bem, mas bem.
O treze tem razão, avança mas é para o livro e depressa. Estás preparadissimo.
Além de teres cultura para isso, tens a imaginação necessária e escreves bem, muito bem.
Não te podes perder Jesus...
E olha que os Jesus estão em alta.
Treze,
Livro é coisa séria, pouco provável nesta fase da vida, mas obrigado :)
Gata? Porquê? Não pode ser coelhinha?
Luz,
Valiosa moeda e com uma capacidade enorme de capitalização. :)
Storyteller,
Estás a imaginar? Boa, de certeza que agora estás mais rica com os sorrisos ;)
Sabes que não tens de quê :)
Ana,
A imaginação tem dias, outros é comó caraças, irra que até chateia ;)
Obrigado pelo empurrão ;)
Beijos
WAI,
A musica é linda, teria sido a ideal para este post ;)
Beijosss
Hedgie,
Cantam, dançam, conversam, riem, beijam,… :)
Tu sabes que eu sei que tu sabes que mesmo dos casais impróprios podem nascer filhas perfeitas :)
Beijo
Forte,
Palavras sentidas eu sei, vamos ver se algum dia será possível :)
O teu Jesus, pode ser que não se perca, este anda perdido há muito, pode ser que se encontre :)
Abraço
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